Enquanto houver discriminação, intolerância
política, étnica e religiosa a criar cenários de guerra e perseguições há refugiados.
O Alto Comissariado das Nações Unidas para os
Refugiados (ACNUR) é uma agência da ONU fundada em 1951 pela Assembleia das
Nações Unidas com o propósito de apoiar, dar assistência e proteger todo o
indivíduo ou toda a população vítima de perseguição, violência e intolerância.
Constituindo atualmente uma das principais agências humanitárias do mundo, procura
cumprir dois objectivos básicos: proteger homens, mulheres e crianças
refugiadas e procurar soluções que proporcionem um regresso permanente a uma
vida normal e condigna.
A Convenção de Refugiados de 1951 determina
que o termo refugiado aplicar-se-á a qualquer pessoa que “receando,
com razão, ser perseguida em virtude da sua raça, religião, nacionalidade,
filiação em certo grupo social ou das suas opiniões políticas, se encontre fora
do país de que tem a nacionalidade e não possa ou, em virtude daquele receio,
não queira pedir protecção daquele país; ou que, se não tiver nacionalidade e
estiver fora do país no qual tinha a sua residência habitual após aqueles
acontecimentos, não possa ou, em virtude do dito receio, não queira regressar.” - Convenção
de 1951 do Estatuto de Refugiados, artigo 1º, e Protocolo relativo ao Estatuto
dos Refugiados aprovado em Assembleia Geral em 1967. A Convenção também
estabelece que “nenhum país deve expulsar ou devolver um refugiado,
contra a vontade do mesmo, em quaisquer ocasiões, para um território onde possa
sofrer perseguição.”
No final de 2010 estavam sob a jurisdição da ACNUR 10.549.686 refugiados, a sua
maioria oriundos de países africanos e asiáticos, e 14.697.804 de deslocados
internos. Se as catástrofes naturais podem explicar a deslocação forçada de
algumas das populações, são os conflitos resultantes da intolerância política,
étnica e religiosa que constituem a grande razão para que continuemos a
confrontar-nos com este flagelo.
Na década de 90, do século XX, a guerra civil
que deflagrou no Ruanda entre a etnia tutsi (minoritária) e os hútus (etnia maioritária)
levou à perseguição e ao massacre de milhares de tutsis pela população hútu. Os
danos humanos desta crise são incontornáveis: dois milhões de refugiados,
aproximadamente 1.5 milhões de deslocados internos e estima-se que, entre os
meses de Abril e de Julho de 1994, foram mortas cerca de 800.000 pessoas.
Na mesma década, entre os anos 1992
e 1995, a região da Bósnia e Herzegovina sofreu um conflito armado que envolveu
os três grupos étnicos e religiosos da região: os sérvios cristãos ortodoxos,
os croatas católicos romanos e os bósnios muçulmanos. Qualificado como o mais
violento e prolongado conflito da Europa desde o fim da II Guerra Mundial, vitimou
200.000 pessoas (entre militares e civis) e criou 1.8 milhões de refugiados e
deslocados internos.
Entre 2003 e 2006 a região do Darfur
foi palco de um conflito armado que desencadeou, no entender da Nações Unidas,
uma das maiores crises humanitárias. Darfur é uma região semi-árida localizada
no oeste do Sudão constituída maioritariamente por populações de origem
centro-africana. Os Fur, os Masalit e Zaghaw constituem as três etnias predominantes, em geral
muçulmanos ou seguidores de outras religiões africanas. Estas populações não
árabes foram alvo de perseguições empreendidas por milícias árabes, denominadas
Janjawid, recrutadas entre os Baggara, tribos nómadas de língua árabe e de
religião muçulmana. Neste conflito étnico-cultural, que continua a registar
focos de tensão, estima-se que já morreram 400.000 pessoas e que entre
refugiados e deslocados no interior do país o número ronde os 1.9 a 2.5
milhões de indivíduos. De acordo com os dados estatísticos do ACNUR, o Sudão
registava em 2010 um total de 387.288 refugiados, valor superior ao da população
da Islândia, que é, de acordo com os dados estatísticos de 2011, de 311.058 habitantes.
Segundo os relatórios do Conselho
Norueguês para refugiados e do ACNUR, o atual conflito sírio já vitimou 11 mil
pessoas, provocou mais de 200 mil desalojados internos e 61 mil refugiados, aproximadamente. Em
reunião realizada no dia 20 de Abril deste ano, o Director de Programas de
Emergências da UNICEF anunciou que 50% dos refugiados que cruzam a fronteira
sírio-libanesa são menores de idade. Para além dos desalojados internos
resultantes do actual conflito, a Síria já tinha cerca de 400 mil pessoas
desalojadas em consequência da guerra de 1967 com Israel.
Deslocados à força por verem as suas
aldeias destruídas e vandalizadas, os familiares, amigos e vizinhos
assassinados sem outra razão que não seja a diferença étnica, política ou
religiosa, os seus haveres devastados, os quais, muitos já parcos, só
conseguiam manter uma mera subsistência familiar; obrigados a percorrerem
centenas ou milhares de quilómetros até encontrarem um local que os faça sentir
protegidos da violência de que foram alvo, os campos de refugiados constituem
para a população refugiada e para os deslocados internos um “porto seguro”, a
esperança de que afinal pode haver um futuro.
Os conflitos por que estas regiões
passaram (muitas mais foram cenários de crises humanitárias ao longo do século
XX e continuam a ser nestas primeiras décadas do século XXI) espelham a
incapacidade da humanidade viver em sintonia com os direitos mais básicos do
ser humano:
-
“Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos…
devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade.”
-
“Todo o indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.”
-
“Ninguém será submetido a tortura nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos
ou degradantes.”
-
“Toda a pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para lhe assegurar e à
sua família a saúde e o bem-estar, principalmente quanto à alimentação, ao
vestuário, ao alojamento, à assistência médica e ainda quanto aos serviços
sociais necessários…”
Princípios, consagrados na Declaração
dos Direitos do Homem, que todos os povos e países deviam de reconhecer e
respeitar de modo maduro e responsável.
Pedem pão e
a certeza de comê-lo