sábado, 21 de julho de 2012

Tombuctu, uma ponte para o passado


Tombuctu é a região mais setentrional do Mali e abrange uma grande área do sudoeste do deserto do Sara. A capital da região, a cidade de Tombuctu, foi elevada a Património Mundial em 1988. Fundada pelos Tuaregues nos inícios do século XII, nas proximidades do rio Níger, a cidade foi parte integrante do importante e rico reino de Mali (1325 - 1433) e do de Songhay (1468-1591).
Conhecida como a Cidade dos 333 Santos, Tombuctu constituiu entre os séculos XIV e XVI, sob as dinastias Mandinga e Askia, um importante centro comercial, cultural e espiritual e um foco de difusão da religião muçulmana em África. A esta antiga encruzilhada de grandes caravanas e pólo de aprendizagem chegavam, vindos de diferentes regiões de África, engenheiros, arquitectos e estudiosos do alcorão…Tombuctu atraía viajantes de países longínquos. Os escribas copiaram milhares de obras de teologia, literatura, ciência, geografia e história, obras que chegavam à cidade através dos comerciantes nómadas. Foram também elaboradas obras originais de música e de poesia, muitas ilustradas com iluminuras de ouro.
A Unesco estima que já foram inventariadas cerca de 15 mil obras e que 80 mil ainda estarão dispersas por vários locais da cidade.
Classificadas pela Unesco, as mesquitas de Djingareyber e de Sidi Yahia e a universidade de Sankoré, reconstruídas durante o reinado do Íman Al-Aqib, da dinastia Askia (1493-1591), são testemunhos desta época áurea.
Nos inícios do século XIV, sob a égide Sultão Kankan Moussa (1312-1335/37), da dinastia Mandinga, foram fundadas a mesquita de Djingareyber e a universidade de Sankore. A mesquita foi construída por arquitectos trazidos da Andaluzia e do Cairo pelo Sultão, depois de ter regressado da sua peregrinação a Meca, em 1325.
Com a construção da mesquita de Djingareyber e da universidade, Tombuctu converteu-se num importante pólo de comércio, conhecimento e de cultura. A universidade acolhia astrónomos, matemáticos e juristas, atraindo estudiosos muçulmanos de toda a África e do Médio Oriente.
Entre 1570 e 1583 a mesquita sofreu várias intervenções que a engrandeceram: o minarete construído na época ainda continua a dominar a paisagem urbana actual. Como a mesquita Djingareyber, a universidade também foi restaurada pelo Íman Al-Aqib, entre 1578 e 1582. A mesquita de Sidi Yahia, construída possivelmente por volta de 1400, foi restaurada entre 1557 e 1578.
Supõe-se que no período da dinastia Askia cerca de 25 000 alunos frequentavam os vários centros de estudos do alcorão, entre os quais a universidade corânica de Sankore.
O esplendor de Tombuctu começou a desvanecer-se a partir do século XVI, apagando-se totalmente com o passar do tempo. Apesar de esquecido, os monumentos que continuam a despertar os nossos olhares para este ponto do Mali, e que outrora simbolizaram um saber intercultural e religioso, transformaram-se, por essa mesma razão, em mais um cenário de destruição e violência provocado por um extremismo religioso.
Depois do golpe de Estado de 22 de Março, aproximadamente dois terços do Mali ficaram sob o controlo do grupo Ansar Dine, combatentes rebeldes salafistas que preconizam a eliminação de todos os locais considerados sagrados, incluindo os mausoléus e os lugares com símbolos artísticos.
Este grupo rebelde defende que a veneração dos santos, sendo uma idolatria, não pode ser apoiada, tendo que se avançar para a destruição dos elementos que mantêm vivo o culto dos santos. Os combatentes prometem arrasar os túmulos dos santos de tradição sufista.
Desde o início dos tumultos já foram arrasados nove dos dezasseis mausoléus, alguns dos quais na mesquita Djingareyber, e a porta da mesquita Sidi Yahia arrombada. Numa declaração proferida a 18 de Junho, os responsáveis pelas bibliotecas comunicaram que a presença de grupos armados coloca em perigo o acervo de manuscritos.
No dia 28 de Junho, a Unesco, a pedido do Governo do Mali, colocou Tombuctu na lista do Património Mundial sob ameaça.
A comunidade internacional assiste, mais uma vez impotente, à devastação de um património que retrata, num continente em que as notícias e as lembranças mais frequentes estão relacionadas com golpes de estado, conflitos militares, catástrofes naturais e crises humanitárias, um tempo, uma época, uma sociedade onde se privilegiava o saber, a tolerância como impulsionadora do conhecimento cultural, científico e religioso - o que de melhor a humanidade pode e deve criar.

O Mali é atualmente um país de grandes músicos, não sendo por isso de estranhar que muitos integram a chamada World Music. Um dos génios musicais, já falecido, é Ali Farka Toure, considerado o “Rei dos Blues do Deserto”.